Esperança
Garcia
Foi no ano de 1770,
no Piauí, que uma mulher negra e escravizada escreveu
uma carta que revolucionou a história do Brasil. O
documento foi revelado em 1979, pelo historiador Luiz Mott,
quando descobriu uma cópia no arquivo público
do Piauí. Acredita-se que a carta original está
em Portugal.
Atualmente, essa é
considerada a primeira reivindicação, ou petição,
de uma escravizada no Brasil que foi enviada a uma autoridade.
Além disso, até agora esse é o primeiro
documento encontrado no Piauí que levou a assinatura
de uma figura feminina.
A mulher era Esperança
Garcia, e hoje ela é reconhecida como a primeira advogada
do Piauí. Na carta em que escreveu, a mulher denunciava
os maus-tratos que ela, sua família, e seus colegas
sofriam diariamente por serem vítimas da escravidão.
A dura vida de Esperança
Esperança trabalhava
em uma fazenda no Piauí, chamada Algodões, localizada
na região de Oeiras, primeira capital do estado. Essa
era uma área que ficou nas mãos do governo,
pertencendo à Inspeção de Nazaré
após a retirada dos jesuítas do local, que foi
ordenada por Marquês de Pombal.
Nesse momento, a mulher,
que na época tinha 9 anos, foi levada como escravizada
para a casa do capitão Antônio Vieira de Couto,
onde começou a sofrer sérias violações.
Não se sabe muito mais sobre a vida dessa moça,
contudo, sua carta revelou as informações atuais.
García relatou que era casada e engravidou do primeiro
filho quando tinha somente 16 anos, tendo casado com o angolano
Ignácio. Ao todo, ela teve 7 filhos.
Ela enviou ao presidente
da Província de São José do Piauí
daquela época, Gonçalo Lourenço Botelho
de Castro, uma carta que descrevia sua situação
desumana na nova fazenda.
Ao denunciar o seu feitor
dos abusos físicos cometidos contra ela e seu filho,
pediu que pudesse voltar para Algodões e ter o direito
de batizar sua filha ainda bebê. Desse modo, ela se
tornou depois de anos um símbolo de resistência
da escravidão.
Sua carta carregava
os seguintes dizeres:
“Eu sou uma escrava
de V.S.a administração de Capitão Antonio
Vieira de Couto, casada. Desde que o Capitão lá
foi administrar, que me tirou da Fazenda dos Algodões,
aonde vivia com meu marido, para ser cozinheira de sua casa,
onde nela passo tão mal. A primeira é que há
grandes trovoadas de pancadas em um filho, sendo uma criança
que lhe fez extrair sangue pela boca; em mim não poço
explicar que sou um colchão de pancadas, tanto que
caí uma vez do sobrado abaixo, peada, por misericórdia
de Deus escapei. A segunda estou eu e mais minhas parceiras
por confessar a três anos. E uma criança minha
e duas mais por batizar. Pelo que peço a V.S. pelo
amor de Deus e do seu valimento, ponha aos olhos em mim, ordenando
ao Procurador que mande para a fazenda a onde ele me tirou
para eu viver com meu marido e batizar minha filha. De V.Sa.
sua escrava, Esperança Garcia”
Acredita-se que ela
não tenha recebido respostas. Depois disso, Garcia
escapou, e seu nome só reapareceu na história
em documentos que datam uma relação de trabalhadores
de 1778.
Ela é apontada
como pioneira da advocacia no estado nordestino. A carta também
é importante nas origens da literatura afro-brasileira.
A data de seu envio, 6 de setembro, é comemorado o
Dia Estadual da Consciência Negra. Ela também
recebeu um memorial com o seu nome, que é dedicado
à memória da cultura negra em Teresina.
Conforme afirmado pelo
site da Instituição Esperança Garcia,
247 anos depois de sua correspondência ter sido enviada,
a grande mulher recebeu do Conselho Estadual da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB-PI), em solicitação
da Comissão da Verdade da Escravidão Negra da
OAB-PI, o título de primeira mulher advogada do Piauí.
Apesar de sua história
ter sido reconhecida, nós ainda não sabemos
qual desfecho ela levou. Informações sobre como
ela aprendeu a ler e escrever ainda não foram descobertas,
e ninguém sabe se ela conseguiu retornar com o filho
à fazenda de Algodões, ou se ela reencontrou
o marido e batizou a filha.
De qualquer modo, sua
vida inspirou movimentos no país, e seu nome é
importante na história como uma luta contra o racismo,
uma consciência de direitos humanos para todos, e uma
resistência contra a escravidão do período
colonial.
Fonte:https:///noticias/reportagem/esperanca-garcia-a-carta-que-revelou-a-historia-da-primeira-advogada-do-piaui.phtml
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